quinta-feira, 27 de novembro de 2008

É NATAL! - Convidado Darkness





O carrilhão dobra a meia noite


Solitário no campanário retumbante


Acolho minha maldita existência


Esqueço a plangente temperança


É Natal! Repicam os dobrados


Mas que é o Natal dos homens


A um ser sem mérito ou esperança?



Transeuntes vagam excitados


Explosões luminosas povoam o céu


Agitação frenética domina o ar


Os brados vivazes ecoam ruidosos


Serei o único a verter as lágrimas?


Serei o único a viver a dor?


Por que não encontro eco aos rogos


Que vomito sobre meu passado?


Por que não me oscula a morte


Anjo despido de virtudes ou pecados?



Meu eu sangra em profusão


A agonia que o abate é cruel


Ainda posso ouvir o riso


Ainda posso ver o rosto plácido


Ainda posso sentir o calor


Do corpo suave e delicado


O perfume inebriante e adocicado


O anjo terreno que me houve roubado


O princípio de meu presente inglório


Este vagar sem fim... amaldiçoado.




Os mortais nada sabem do conflito


Este penar interno que dilacera


Esta mácula mortal que me tortura


Celebram o momento de paz


Mesmo tendo os corações em ódio


Mesmo não se dignando em crer


Naquele que festejam o nascer.



Terá sido, meu crime, mais odioso?


Serei punido pela eternidade?


Por que me recusam a redenção?


Por quanto mais este sofrer?


Nem mesmo a bênção do fim


O repouso abençoado da entrega


O dom de poder, enfim, morrer...



É Natal! Presentes são distribuídos


Abraços e beijos compartilhados


Sorrisos vagos e ricos em hipocrisia


Tempo de armistício aos litigantes


Olvidam-se as injúrias... os acintes


Celebram a mesa farta e apetitosa


Dizem estar plenos de alegria.



Mas ao lado, lançado a própria sorte


Desfaz-se em prantos um moribundo


Peleja, com a fome, um deserdado


Mendiga um pedaço de pão


Vai seguindo na sarjeta desumana


Esperando quando ouvirá outro não!



Tanta maldade perpetrada


Tanto mal dissimulado


E o único a mortificar-se


A viver a condenação solitária


A esquecer-se que já morreu


A vagar sem paz... sem lenimento


Este único maldito sou eu!



Vergado pela pena mais rigorosa


Cedo a dor e dobro-me em joelhos


Minhas vistas tingem-se de rubro


Apenas vultos chegam-lhe a razão


Num momento de desatino


Ouço uma celestial canção.


De onde provém mavioso som?


Qual será o anjo a entoá-la?


Procuro a origem da melodia


Busco-a no mais suntuoso palacete


Procuro-a na mais potente igreja


Onde está a fonte da sublimidade?


Incrédulo e indignado a descubro


Não nos cumes da sociedade


Mas em meio às sarjetas da cidade.



Toda minha tortura vaza num instante


Que pode, um ser atormentado


Maldito em sua essência imortal,


Valer diante da simplicidade da criança


Que mesmo tendo apenas a solidão


A abraçá-la com seu frio voraz


Eleva o olhar cândido e solta sua voz


para externar sua gratidão


para expressar sua esperança?



Mesmo que excluído da ventura


Ainda que me seja negada a redenção


O canto singelo de uma criança


Pode mais do que mil vivas


Pode mais que todos presentes


Pode mais que milhares de sinos


Pois ao ouvir suave canto


Senti minha alma aliviar-se


Já não me dobra o peso da condenação


Sinto a brisa serena a soprar


É Natal! Os homens podem conspurcar


Esta data de sentido tão especial


Mas enquanto ecoar, no seio noturno,


Um cântico tão doce e afável


Haverei de permitir-me sorrir


Haverei de ainda acreditar...


Um comentário:

Anita disse...

nossa...muito bonita a sua poesia, aliás é muito comovente...belas e lindas as palavras exprimem uma tal emoção que é deveras... uau... não tenho palavras.
beijos