segunda-feira, 29 de setembro de 2008

ANIVERSÁRIO MACABRO – mini conto




Silvinha estava nas nuvens, seu aniversário havia finalmente chegado. Era hoje o grande dia, a grande festa, os presentes, os amiguinhos, a família.
Hoje ela estava decidida a fazer tudo ser diferente. Silvia era a filha temporã de um casal de idade já meio avançada, e seu pai, que ela tanto amava, só tinha olhos para as outras filhas mais velhas, Silvia era uma coisa não querida, um lapso nas pílulas tomadas diariamente por sua mãe.
Seu pai nem a olhava, era como um móvel da casa grande e bonita, casa antiga com um grande quintal com árvores centenárias. Ela era um incômodo com suas correrias pela casa, suas brincadeiras de menina que tanto o irritavam.

Silvia estava linda, seu vestido novo feito fora do país, por vontade de sua mãe, era estonteante, mas um vestido de menina, não de moças como alguns pais gostam de fazer e pular uma parte tão linda de nossas vidas. Não era possível que o pai não a visse hoje, hoje ela a tomaria nos braços e daria o abraço tão ansiado e desejado. Daria beijos em seu rostinho redondo de olhos azuis e boca vermelhinha, tão linda parecia um anjo.

Todos na família amavam Silvinha, ela era o xodó da casa e de todos, menos de seu pai. Ele não gostava de crianças e odiava quando aquela pestinha vinha para perto dele com seus ataques carinhosos que só o faziam sufocar-se e sentir nojo daquela pirralha insignificante. Lindas eram suas filhas mais velhas com suas famílias e filhos vivendo longe dali, suas filhas sim não davam trabalho algum, pelo contrário, elas o ajudavam mensalmente com dinheiro para as despesas da enorme casa antiga, mas que ninguém queria vender haviam todos crescido ali e era dali que tinham as mais tenras lembranças.

O jardim era o ponto algo da casa, enorme, todo arborizado com árvores centenárias e imensas que davam um ar majestoso ao velho palacete. Era ali que Silvinha mais gostava de ficar, podia correr, brincar com os cachorros, se sujar, sentar na grama, subir nas árvores, comer frutos madurinhos das árvores frutíferas que havia ás pencas, de todos os tipos.
Ela passava o dia inteiro no jardim. Em casa não podia fazer barulho ou seu pai ficaria irritado, já era um velho aposentado e muito ranzinza.

À noite finalmente chegou trazendo os convidados, música, os tão esperados presentes, os amiguinhos da escola, todos estavam ali, menos o seu pai.
Ele estava ainda em seu quarto.
Em alguns minutos, Silvia viu quando o pai saiu do quarto e vinha descendo pela grande escadaria.
_ Papai, papai veja – gritou a menina. Veja meu vestido novo que mamãe comprou para meu aniversário, veja papai não é lindo?
O pai passou por ela sem ao menos dar-lhe um olhar, seu coração pesou, sua alegria se esvaneceu. Seu pai, seu adorado pai nem olhara para ela, não vira o vestido, não vira os olhinhos que brilhavam com amor e esperavam ansiosos por um simples carinho. Mas ele fora embora falar com os amigos, como sempre, e ela ficou esquecida aos pés da escadaria.
A tristeza a corroia por dentro, esqueceu-se dos amiguinhos, dos presentes, de todos, queria agora era chamar atenção de seu pai. Não era possível que nem no dia de seu aniversário ele não iria nem olhar em seus olhos e desejar parabéns, pois presente ele nunca havia dado mesmo.
Correu para o jardim, entrou no depósito de ferramentas e pegou uma grossa e comprida corda, papel, tinta e cola.
Já tomara sua decisão, hoje sim o pai iria olhar para ela de qualquer forma, querendo ou não. Nem que fosse apenas esta vez, mas pelo menos teria seu olhar, o olhar de um pai que nunca a amou de verdade.

_ Aiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii – veio o grito lá de fora do jardim todo iluminado.
Quando todos saíram para ver o que estava acontecendo, viram Paula, amiguinha de Silvia chorando e gritando como louca em estado de choque e, quando viraram o rosto para o lado esquerdo, para o lado das árvores, todos ficaram mudos e em estado de puro horror.
Pendurada pelo pescoço na grande árvore jazia o corpo de Silvinha, morta com uma feição de esgar, com a boca aberta quase inteiramente e a cabeça caída de uma forma muito estranha para o lado, o pescoço havia quebrado na queda.
Naquele instante o pai de Silvia saiu de dentro da casa já gritando que barulheira era aquela quando viu o corpo da filha pendurada na grande mangueira.
Ele caminhou em direção ao corpo e viu em câmera lenta, como se não estivesse vendo aquilo.
Parou em frente ao corpo, todos ao lado em comoção, a mãe desmaiada, as tias gritando e chorando e olhando para ele com ódio nos olhos. No peito de Silvinha, em cima do vestido tão lindo e caro, bilhetes colados com letras grandes escritos com tinta vermelha por ela antes de se jogar do mais alto galho da árvore:
_ Papai, veja meu vestido novo, não estou bonita? Agora sim papai, tenho certeza que o senhor está olhando para mim, olhando para sua filha que nunca viu ou amou. Eu te amo papai.



By Ana Kaya Cristina

7 comentários:

nelson_magrini disse...

Forte e impactante, como só uma boa autora consegue fazer.

Parabéns!

Ana Kaya disse...

wowwwwwwwwwwww nelson magrini dizendo isso pra mim, eu fico toda cheiaaaaaaaaaa olha eu voando lá no altoo seguraaaaaaaaa ehehehh
brigada amigo nelson, vc é um amor.

MPadilha disse...

olha minha amiga ana abafando, rss
muito bom conto, como sempre...
beijos

Adriano Siqueira disse...

Me arrepiei quando descreveu a maneira como ela estava, com o pescoço quebrado!
uma lição para os pais que sempre tem um filho preferido.
Muito bom Ana Kaya!!! :-)

abraços e uma adorável noite cheia de novas inspirações.

Caio Tadeu de Moraes disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Caio Tadeu de Moraes disse...

Pulmões e coração petrificados: uma sensação gélida e sombria acabou de atravessar meu peito; como se um fantasma sem rumo acaricia-se meu ombro. O final foi um verdadeiro choque – ainda estou tentando extrair as enguias – minha mente e alma nunca esperariam por tal desfecho. Realmente Ana, foi muita crueldade ter começa a narrativa tranqüila e inocente, e depois desferir este golpe brutal nas últimas linhas; não há sanidade que agüente (ahauahahau brincadeira!!). Cru, clássico, profundo, atormentador e com muito charme; eu adorei, me marcou de verdade. O fato “filho prodígio, filho bastardo” é uma polêmica grave enraizada na coluna dorsal de nossa sociedade e que muitas vezes passa em branco; mas é bom saber que você tomou esta causa^^. Cada dia que passa eu me impressiono mais com a mitologia kayana (kkkkk), desde quando li um conto seu na Estalagem, se não me falha a memória, sobre vampirismo com toques libidos. Me passe um link onde eu possa melhor me aventuras por estas terras sombrias cheias de amor, graça, morte e vampiros =D

Ps: sou seu fã!!!

Ana Kaya disse...

Adriano, Caio, puxa obrigada pelos comentários, fico até vermelhinha (é que ingeri sangue há pouco ehehh).
Que estímulo pra que eu continue sempre a tentar.
Obrigada gente, estou sem palavras.
Bjs grandes