quinta-feira, 21 de julho de 2011

Uma história de Rita

      No pequeno quarto fechado e mal iluminado, a luz do abajur vermelho pesava sobre o ar quente e abafado. Flutuava um acre de suor e sexo. A romper a solidão, um arfar de corpos entrelaçados atingia seu êxtase. Em seguida, o silêncio da exaustão.
      O amanhecer se desejava entre tímidos feixes de luz que traspassavam as brechas da veneziana de madeira mofada. Trazia o frescor das ervas daninhas do quintal e amenizava a densa atmosfera do quarto. Uma brisa nos cabelos da velha prostituta adormecida de bruços descobriu-lhe o olho direito, que, no descerrar de suas pálpebras, pode vislumbrar os lábios cianosados e a pele marmórea do seu velho e costumário cliente; percebia que seu habitual e intenso roncar se transformara numa silenciosa e definitiva apnéia. Levantando-se vagarosamente, fitou o corpo obeso e frio sobre sua tão frequentada cama e constatou que dera o último momento de prazer ao calado homem que a visitava toda terça-feira, infalivelmente, para comprar o que a vida não mais lhe proporcionava.
       Com a serena sensação de dever cumprido, Rita pegou o telefone e chamou uma ambulância.

2 comentários:

Dolce Vita disse...

Os últimos momentos de um homem testemunhados por aquela que, talvez, tenha sido a única a dar-lhe paz além da satisfação do desejo.

Excelente minimalista.

Beijo

MPadilha disse...

Caramba! A gente quase que imagina todo o recinto! Lençóis, paredes, cheiros...Uma descrição perfeita!
E o sentimento? Um casal se completando, uma profissional afastando a solidão de um cliente; um cliente dando a sensação de utilidade a uma prostituta...Quase um casal de velhos que passou a vida cuidando um do outro...
muito bom!